NAS DOBRADURAS DA VIDA

“Toda vez que que tento resistir a algo, toda vez que me vejo afundando em incertezas, sou como um náufrago na imensidão do oceano. Por hora me agarro a qualquer objeto que me faça flutuar sem saber quanto tempo permanecerei nesta condição.
Ser resiliente, não me faz sentir resiliência. A incerteza é como um abismos de profundezas desconhecidas. De repente estou vestida de medo sentindo-me nauseada pela vertigem de estar na beira do terreno. De súbito me vem a frustração, companheira indesejada, pois sei que o que ela quer é me convencer a desistir. Então me fala da carne espalhada pelo chãos caso eu resolva me atirar no vazio. Não me poupa de nenhum detalhe. Tapo os ouvidos não quero escutar.
Fico pensando nos pássaros quando abandonam seus ninhos. Antes disso houveram bicos esgarçados clamando por comida e piados estridentes numa luta incessante pela sobrevivência. Eis que chaga o dia, em que já com as asas fortes podem alçar o tão almejado voo.
O período do aprendizado é difícil e as vezes doloroso. Como caminhar com sapatos novos que vão dilacerando os calcanhares. Não temos outra alternativa se não prosseguir. A rua é suja e prefiro o sangue escorrendo pela pele as bactérias. E neste exato momento entendo tudo; da próxima vez vestirei meias grossas ou trarei comigo um par de band aid.”

Há algo na arte de dobrar que escapa ao olhar comum. Não é a simples força que resiste, mas a flexibilidade que cede e depois se recompõe. O poder de dobrar ou mesmo ricochetear é o que nos faz resilientes. Na vida, como na matéria, há uma força misteriosa que nos permite curvar sem quebrar.
Quando nos dobramos, é como se o tempo se alongasse, os dias se distendessem em uma corda fina que insiste em se esticar, mas não arrebenta. No entanto, é nos momentos de maior pressão, de mais cansaço, de mais dor, que as fibras de nossa alma se entrelaçam, se fortalecem. Quanto mais tempo permanecemos na dificuldade, mais a dor se torna uma professora, mais a resistência vira uma arte que aprendemos a dominar. Como o vento que dobra a árvore sem quebrá-la, como a maré que empurra a pedra até ela se suavizar. Não é fraqueza, mas uma sabedoria silenciosa que reconhece que o ponto de ruptura não está na resistência, mas na capacidade de se adaptar, de se render e, então, retornar mais forte.
Nos dobramos, e a vida nos dobra. Não como se fôssemos peças frágeis, mas como se estivéssemos sendo moldados, como se a dor fosse o escultor que vai retirando, pouco a pouco, as arestas que nos prendem ao que já fomos. Quanto mais tempo permanecemos na dificuldade, mais aprendemos a ver com outros olhos, a sentir com outros sentidos. O sofrimento, aquele que parecia insuportável, passa a ser uma lição que, paradoxalmente, nos ensina sobre o que é a leveza. Pois, no fundo, não são as quedas que nos definem, mas a capacidade de nos levantar, de nos recompor, de encontrar o nosso eixo novamente.