A ARTE COMO CAMINHO DE CURA PARA UMA SOCIEDADE ADOECIDA

Estamos presos a uma coleira invisível — uma energia sutil e persistente que nos convence de que nunca somos o bastante. Vivemos em busca de algo que mal sabemos nomear. Procuramos nas relações, no trabalho, nas conquistas, uma sensação de completude que sempre escapa por entre os dedos. E quando nos perguntamos por que nada é suficiente, por que ainda falta, não encontramos resposta. Apenas mais silêncio.

Atribuímos essa ausência ao outro. Acreditamos que tudo se resolverá se alguém nos amar, se formos reconhecidos, se os nossos pais finalmente se orgulhar de nós. Mas essa crença é uma miragem, projetada por um sistema que nos condiciona a buscar fora o que só pode ser encontrado dentro. Um sistema que classifica, que mede, que julga o valor da existência por métricas que não contemplam o invisível.

A grande ilusão está em tentar quantificar o que nunca foi matéria. Não existe régua para medir o suficiente. O que existe — e que negligenciamos — é a intenção. É a qualidade do gesto, o amor colocado na palavra, o cuidado depositado nas ações. Se quero me sentir amado, eu amo. Se desejo ser útil, me torno presença. Mas estamos distraídos, anestesiados, girando em círculos dentro de uma comunidade de olhares vazios, comparações e fantasias. Observamos as vidas alheias como se houvesse uma fórmula secreta para ser feliz, como se a paz fosse prêmio de uma loteria existencial.

Mas talvez o erro não esteja na busca, e sim no lugar onde procuramos. Porque a resposta, ainda que silenciosa, sempre esteve aqui — diante de nós. A arte.

A arte não é uma fuga. É um retorno. É o caminho que, por mais que tenhamos desviado dele, nunca deixou de estar à vista. Ela não se impõe, apenas convida. E quando aceitamos esse convite, algo dentro se reorganiza. Ao tocar o piano, escrever um verso, misturar cores numa tela ou mover o corpo em dança, o tempo muda de ritmo. O coração desacelera. A mente encontra repouso. A alma, morada.

No início, pode haver hesitação. A arte não exige técnica, mas coragem. A coragem de entrar em contato com o que sentimos, sem máscaras, sem defesas. De reconhecer o caos e, ainda assim, criar beleza. De se permitir ser canal, e não controle. Aos poucos, vamos nos preenchendo. Não com certezas, mas com sentido. E isso basta.

A arte nos reconecta ao que é essencial. Nos lembra que existe beleza no imperfeito, graça no improviso, valor no invisível. Que somos mais do que conseguimos explicar. E que, ao expressar o que vive em nós, encontramos um lugar de pertencimento que nenhum sistema pode oferecer.

Em tempos de uma sociedade adoecida, perdida em diagnósticos e curas artificiais, a arte se apresenta como remédio da alma. Não como solução rápida, mas como processo profundo de reconexão. Ela não está lá fora. Está aqui. Sempre esteve. E talvez o primeiro passo seja simplesmente olhar.