SÓ DAMOS VALOR QUANDO PERDEMOS:
Como a Gratidão Transforma Nossa Relação com a Vida

Quantas vezes já nos pegamos dizendo: “Eu não sabia o quanto aquilo era importante até perder”?
Seja o término de um relacionamento, a saída de um emprego ou a saúde que antes parecia garantida, essa verdade parece uma constante. O ser humano tende a valorizar algo apenas quando sente sua ausência. Mas por que isso acontece? E como podemos mudar essa perspectiva?
Explorar essa questão nos leva a uma análise profunda sobre o medo da mudança e a falsa crença de que as coisas na vida são permanentes. Vamos recorrer à filosofia estóica para encontrar respostas e à neurociência para descobrir o antídoto: a prática da gratidão.
O Medo da Mudança e a Ilusão da Permanência
O medo da mudança é um dos maiores sabotadores da nossa felicidade. Muitas vezes, ele nos faz apegar a ideias, relacionamentos ou circunstâncias que já não nos servem mais, mas que nos passam uma sensação falsa de segurança. Essa resistência nasce da crença equivocada de que as coisas podem ser controladas ou que permanecerão iguais para sempre.
Os estóicos, filósofos que buscaram viver em harmonia com a natureza e aceitar as incertezas da vida, tinham uma visão muito clara sobre isso. Sêneca, por exemplo, dizia: “Nada nos pertence; tudo é emprestado pela vida.” Segundo ele, a transitoriedade das coisas não é algo a temer, mas a compreender. A mudança é inevitável, e a dor de perder algo é muitas vezes amplificada pela nossa incapacidade de aceitar essa verdade. A vida é orgânica, o que está neste segundo já não está no segundo seguinte. Tudo muda, tudo passa; tudo está constantemente nascendo e morrendo, fazendo e se desfazendo. Mas parece que nossos desejos vão contra a aceitar esta realidade.
Marcus Aurélio, em seu livro Meditações II,12; escreve:
“Como tudo desaparece rapidamente: no mundo, os próprios corpos; no tempo, as lembranças deles; tais são todas as coisas sensíveis e, sobretudo, as que seduzem mediante o prazer, amedrontam mediante o sofrimento ou têm forte repercussão mediante a fama que se esfumaça; como são vulgares, desprezíveis, triviais, corruptíveis e mortas diante da razão capaz de examiná-las.”
Enquanto estamos imersos no cotidiano, esquecemos que tudo à nossa volta – pessoas, experiências, até o nosso próprio corpo – está sujeito ao tempo. Vivemos como se o “amanhã” fosse uma certeza. No entanto, os estóicos nos ensinam que cada momento é um presente – “Lembre-se da impermanência das coisas, (…) “Ao beijar filho ou esposa, repita para si: estou beijando um mortal.” -Epictetus
A Gratidão como Antídoto
A prática da gratidão é a chave para combater o apego e o medo da mudança. Quando somos gratos, reconhecemos o valor do que temos enquanto ainda o possuímos. Em vez de olhar para a vida como uma sequência de carências ou perdas, passamos a enxergar as bênçãos que já estão ao nosso redor.
Mais uma vez Marco Aurélio, nos convida a pensar. “Quando você acordar pela manhã, pense no privilégio de estar vivo, de respirar, de pensar, de amar.” Essa reflexão não apenas nos torna mais presentes, mas nos protege do arrependimento que tantas vezes acompanha a perda.
Contudo a gratidão vai além do agradecer; ela é antes de tudo uma coisa boa pra nós mesmos. Se a lei e a justiça diz respeito também ao outro, a gratidão, retorna em grande medida a nós mesmos. ”Não há um homem que, quando tenha beneficiado o seu próximo, não se tenha beneficiado (…) a recompensa por todas as virtudes, está na própria virtude.”
Praticar a gratidão também é um exercício de humildade. Ela nos ajuda a lembrar que nada nos é devido, e que tudo o que temos é, em última análise, um presente temporário. Essa mentalidade transforma nossa relação com a vida e nos ajuda a acolher as mudanças inevitáveis com mais serenidade.
A Ciência da Gratidão
A neurociência tem muito a dizer sobre os benefícios da gratidão para o bem-estar. Estudos mostram que praticar a gratidão ativa áreas do cérebro associadas à recompensa e ao prazer, como o córtex pré-frontal e o núcleo accumbens. Isso libera dopamina e serotonina, neurotransmissores que contribuem para a sensação de felicidade e satisfação. Expressões de gratidão ajudam a construir e manter relacionamentos de longo prazo, lidar com adversidades e se recuperar delas com força e motivação.
Além disso, a gratidão tem efeitos duradouros sobre a saúde mental. Pesquisas indicam que pessoas que mantêm um diário de gratidão experimentam menos sintomas de depressão e ansiedade, têm uma maior sensação de propósito e até dormem melhor. Quando somos gratos, nosso cérebro se reconfigura para focar no positivo, criando um ciclo virtuoso de bem-estar.
A gratidão traz felicidade
A gratidão melhora as relações interpessoais em casa e no trabalho (Gordon, Impett, Kogan, Oveis, & Keltner, 2012). A conexão entre gratidão e felicidade é multidimensional. Expressar gratidão não apenas aos outros, mas também a nós mesmos, induz emoções positivas, principalmente a felicidade. Ao produzir sentimentos de prazer e contentamento, a gratidão impacta nossa saúde e bem-estar geral.
Em uma pesquisa sobre gratidão em profissionais adultos, o psicólogo britânico e especialista em bem-estar Robert Holden descobriu que 65 de 100 pessoas escolheram a felicidade em vez da saúde, embora tenham indicado que ambas eram igualmente importantes para uma boa vida. Holden, em seu estudo, sugeriu que as raízes de muitas condições psicopatológicas como depressão, ansiedade e estresse estão na infelicidade.
Práticas simples como manter um diário de gratidão, elogiar a si mesmo ou enviar pequenos presentes e notas de agradecimento podem nos fazer sentir muito melhor e melhorar nosso humor instantaneamente. Estudos com casais também indicaram que parceiros que expressavam frequentemente sua gratidão um ao outro conseguem manter seus relacionamentos com confiança mútua e lealdade tornando-os mais felizes e duradouros.
Uma Mensagem para Levar para Casa
Praticar a gratidão é sinônimo de expressar nossos sentimentos pelos outros e por nós mesmos. Com simples palavras de amor e elogio, não apenas fazemos os outros se sentirem bem, mas também nos sentimos muito melhor sobre nós mesmos e nossas vidas. A gratidão consiste em sentir da maneira certa, sobre as coisas certas e no momento certo. Está inseparavelmente ligada à autodisciplina e à motivação.
Pode não nos dar alívio instantâneo da dor e do estresse, mas nos traz de volta a sensação de controle. Ao reconhecer e apreciar nossos ativos, a gratidão nos dá o comando de nossas próprias vidas. Como Robin Sharma colocou belamente:
“A gratidão impulsiona a felicidade. A felicidade aumenta a produtividade. A produtividade revela o domínio. E o domínio inspira o mundo”.
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